É tempo de viver sem medo VI

por Carlos Frankiw

22 de junho de 2013

“É tempo de viver sem medo”
Eduardo Galeano

Pipoca com gás…

Do que vivi, do que sei. Falo por mim, anarquista, empunhando, enquanto os braços permitiram, uma “rojo y negra” nesta tarde/noite. Salvo no início, não me recordo de demasiadas hostilidades às bandeiras vermelhas; do que sei, era um indivíduo em multidão e não posso garantir a veracidade plena da última assertiva.

Se o povo acordou, o pobre nunca dormiu. Inúmeros cartazes, bandeiras, batucadas, carnaval, e sol dos infernos. Pixos, violência é o outdoor. Muito, mas muito mais gente do que segunda-feira.

Abraão Caram deve ser alguém importante pra receber o nome de uma avenida. Antonio Carlos, do que sei, foi um presidente do Estado durante a “Revolução” de 1930. Magalhães Pinto foi um governador, ativo entusiasta do Golpe Civil-Militar de 1964 e tem um estádio em Belo Horizonte com seu nome. Os dois cruzam seus destinos há cerca de um quilômetro do estádio que detém a honra de ser nomeado pela referida figura política acima citada.

Quando cheguei, explosões. Medo e tentar avançar, impossível, faltam óculos. À cerca de 50 ou 100 metros de linha de frente, na linha de frente uma “rojo y negra” empunhada por um anarquista e bom amigo. Bombas, mais bombas, o dantesco expresso pela distância e o fato de um pipoqueiro estar ali com seu carrinho a comercializar seus produtos. Por absoluta fome, comi um saco que uma amiga me arrumou, o pipoqueiro vende seus produtos sem muito sal na linha de frente, por saber que quase ninguém ali tem mais água (para quem bem se interessar). Barricadas de fogo, muitos a tentar ir em frente, rumo ao território que outrora pertencia à República Federativa do Brasil e que se encontra sob a jurisdição da Oligarquia FIFA & Sócios (tratemos bem os turistas, bem nos diz a Presidência).

Vandalismo. Do que vi: vandalismo é um conjunto de cidadãos se manifestarem em território em tese pertencente ao seu país e serem impedidos por patriotas concidadãos em seu dever de manter a ordem (como bem nos diz a Presidência); vandalismo são bombas, e mais bombas de gás atirados a esmo enquanto cidadãos que espiritualmente tiveram uma coletiva viagem à Índia dos anos 30 e 40 do último século, e que aparentavam desconhecer suas forças policiais pediam para nos sentarmos (cantando serem brasileiros, com muito orgulho e amor, enquanto eu declamava ser anarquista, com os mesmos adjetivos); vandalismo são bombas e mais bombas atiradas pelas costas em gente sem força alguma para reagir vindas, ao que parece, do território da Universidade Federal de Minas Gerais (outrora, território brasileiro); vandalismo é novamente atemorizar quem, por cansaço, por ter tentado ficar, estava na linha de trás de uma manifestação em seu retorno, apenas para que os mesmos tenham o bom prazer de subir correndo a ladeira mais íngreme da via do nome do Presidente do Estado depois de terem caminhado algo em torno de 14 quilômetros (9 sob certo sol escaldante); vandalismo é ter de fazer este trajeto sob luzes estranhamente apagadas.

Gás, desnecessário dizer, arde. Os olhos, principalmente, pra quem não se protege. As vias respiratórias, os pulmões, idem.

Mas é que sou anarquista. Gás dá fissura, vira perfume, quando se sabe estar a lutar por direitos. Vou, novamente. Preferencialmente com óculos.

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